Envergando um longo vestido leve de cor púrpura, com bainha franjada e em ziguezague, Orla fumava furiosamente, tomava notas abundantes e levantava-se de um salto de vez em quando para rabiscar algum pormenor pertinente numa das inumeras folhas de papel presas nas paredes do gabinete. Providenciando um relato fluido dos acontecimentos da semana anterior, e a esforçar-se ao máximo para os fazer soar cativantes, Millie encontrava-se sentada na chaise-longue e estendia-lhe as canetas de feltro das diversas cores para que Orla, que passava rapidamente por ela, pudesse agarrar na que correspondia a cada personagem.
Bem, um relato fluido, da maioria dos acontecimentos da semana anterior. Millie tinha decidido que Hugh não devia ser incluído em nada daquilo. Contudo, estava a sentir-se um bocadinho culpada, interrogando-se se seria uma atitude traiçoeira.
Afinal, Orla estava a pagar-lhe bastante dinheiro pela versão integral da sua vida e ali estava ela, deixando de fora a pessoa que estava presentemente a perturbá-la.
Não que Hugh estivesse ciente do facto, é claro.
Esperava ela sinceramente.
(...)
De qualquer modo, ela não ia contar a Orla e ponto final. E, decerto, deixar alguém de fora não era enganar. Inventar personagens, inventar acontecimentos, fingir que tinham acontecido coisas quando não tinham - bem, isso é que era enganar. Seria uma atitude realmente enganadora, especialmente quando o que Orla queria era material sobre a vida real.
Por isso não tinha mal, tranquilizou-se Millie.
(...)
Jill Mansell
Romance Arriscado, Edições Chá Das Cinco, 2010