Em literatura, o sentido é produzido pelo leitor mediante os estímulos que o texto lhe oferece.
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A obra literária é «enriquecida» por cada leitor «suficiente», que nela descobre (ou gera) novos sentidos. Liberto do autor, o texto ganha uma vida própria. Torna-se uma relação concreta, diálogo, transacção, cópula. Tem a vida que lhe empresta a subjectividade de cada leitor. De Montaigne a Valéry não vai grande distância: história da literatura igual a história dos leitores, melhor, das leituras. Chegamos a uma concepção recente: a de Hans Robert Jauss, paladino da «estética recepcional». Segundo ele, «a vida histórica da obra literária é inconcebível sem o papel activo que desempenha o seu destinatário». Daí o historiador da literatura não passe dum leitor consciente do seu lugar na sucessão histórica dos leitores.
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A literatura é o domínio do instável, miragem de eternidade que paira sobre a corrente dos anos e dos séculos. Um absoluta à escala humana: fica e passa. (...) Porque a obra literária, como acentuou Umberto Eco, é, por natureza, «aberta»:
«A abertura e a "totalidade" não revelam dos estímulos objectivos, em si próprios materialmente determinados; não dependem tão-pouco do sujeito que, em si, se encontra disposto a todas as aberturas e a nenhuma; residem, sim na relação de conhecimento no decurso da qual se efectivam as aberturas suscitadas e dirigidas pelos estímulos, estes, por seu turno, organizados em obediência a uma intenção estética.»
Concebida assim a abertura, a vida das obras através de sucessivos leitores é subjectiva, mas não só, porque a «leitura» é dirigida, orientada por um tecido de estímulos que permanece, como que liberto do tempo, com o seu poder de pro-vocação, de convite.
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Assim a literatura é um espaço de convivência, de comparticipação, onde simultaneamente se afinam o apreço pelo original e a consciência da comunidade. A própria língua, dentro da qual trabalha (é trabalhado) o escritor, impõe a dimensão social do literário.
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Jacinto Do Prado Coelho
Bertrand, 1976