Como é que se define o amor? Como podemos saber se o que sentimos por esta ou aquela pessoa é mesmo amor e não qualquer outro estado intermédio ou subproduto do sentimento em questão?
O amor está tão na moda que as pessoas o procuram e desejam como um bem de primeira necessidade. O amor é a água do coração; sentimos que simplesmente não podemos sobreviver sem ele. E de cada vez que a vida nos obriga a atravessar desertos amorosos, enchemos os cantis de distracções e paliativos, alguns destrutivos (droga, álcool, excessos vários), outros mais construtivos (meditação, desporto, viagens, amigos), até que um oásis de afecto se desenha no horizonte. É claro que o oásis pode ser uma miragem, mas só isso saberemos quando lá chegarmos.
Há oásis qe parecem enormes e se revelam exíguos, outros que pensamos serem desinteressantes e se transformam em lugares bestiais, outros que são confortáveis, porém, aborrecidos, e outros ainda que se assemelham a um jogo de Playstation 2, cheios de desafios e de aventuras onde é preciso manter sempre a concentração para conseguir vencer obstáculos e passar ao próximo nível.
As boas histórias são feitas de obstáculos, da mesma forma que o amor também que se constrói na adversidade? Desconfio sempre das histórias amorosas em que tudo é sempre muito difícil. O amor é um mistério insondável, mas tem os seus sinais inequívocos, e na verdade não existe o amor per si, existem provas de amor. Quem não o mostra é porque não o tem, e, se não o tem, não vale a pena tentar fazer omeletas sem ovos.
As relações amorosas que começam com grandes dificuldades, porque ele nem sempre está disponível ou ela é frequentemente assaltada de dúvidas, não medram; ou a coisa flui ou emperra, e, como diz o ditado, o que nasce torto tarde ou nunca se endireita. O que acontece é que às vezes estamos tão carentes que interpretamos sinais de desamor como prenúncio de amor, dando ao outro o benefício da dúvida.
No amor não há dúvidas quanto à natureza do amor. Podem existir outras, do estilo «gosto dela, mas não gramo a família nem com molho de tomate» ou «ele é adorável, mas vou ter de lhe comprar boxers novos porque odeio aqueles slips que ele usa», mas não pomos em causa o amor que sentimos.
Citando Fernando Alvim numa ds suas crónicas, quando se gosta de alguém temos sempre rede, nunca falha a bateria, nunca nada nos impede de nos vermos e nem de nos encontrarmos no meio da multidão. Quando se gosta de alguém, ouvimos sempre o telefone, a campainha da porta, lemos sempre a mensagem que nos deixaram no vidro embaciado do carro desse Inverno rigoroso. Quando se gosta de algúem - e estou a escrever para os que gostam -, vamos para o local do acidente com a carta amigável, vamos ter com ela ao corredor do hospital ver como estão os pais, chamamos os bombeiros para abrirem a porta, mas nada, nada nos impede de estar juntos, porque nada nem ninguém é mais importante do que nós.
Um dos sinais inequívocos do amor é exactamente esse terceira entidade, o Nós, a consciência de que o Eu e o Outro formam algo que nos diferencia do resto do mundo. E o tempo que temos na nossa vida para Nós.
Margarida Rebelo Pinto
Onde Reside O Amor, Oficina Do Livro, 2008